As investigações conduzidas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pela Polícia Federal trouxeram à tona um dos aspectos mais alarmantes da tentativa de golpe de Estado no Brasil: o plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Batizado de “Punhal Verde Amarelo”, o esquema fazia parte de uma estratégia articulada para impedir a posse do presidente eleito e garantir a permanência de Jair Bolsonaro no poder.
Mensagens obtidas pela Polícia Federal indicam que o plano envolvia o monitoramento de Moraes por agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), além da vigilância clandestina sobre autoridades e opositores políticos. As provas incluem conversas entre militares e ex-integrantes do governo Bolsonaro, que discutiam a viabilidade do atentado contra as principais lideranças do novo governo. O ministro Alexandre de Moraes teria sido alvo de um esquema de emboscada, com agentes disfarçados rondando sua residência para um possível sequestro e eliminação.
Uso de órgãos do Estado na conspiração golpista
As investigações também revelam o desvio de funções de instituições estatais para favorecer a conspiração. A Polícia Rodoviária Federal (PRF), por exemplo, teria sido usada para dificultar o acesso de eleitores a seções de votação em regiões onde Lula teve ampla vantagem no primeiro turno das eleições de 2022. Essa estratégia foi planejada com base em um sistema interno de monitoramento apelidado de “business intelligence”, que mapeava municípios estratégicos para a realização de operações de bloqueio.
Já a Abin teria sido instrumentalizada para espionar adversários políticos e monitorar juízes do STF. Segundo as investigações, uma “Abin paralela” chegou a ser criada para conduzir operações clandestinas de inteligência, com a finalidade de coletar informações sensíveis sobre autoridades e interferir em investigações em andamento.
Autogolpe foi planejado por mais de dois anos
A denúncia da PGR reforça que Jair Bolsonaro e seus aliados começaram a articular a ruptura democrática já em 2021, ao disseminar desinformação sobre a segurança das urnas eletrônicas. O discurso golpista foi intensificado após a anulação das condenações de Lula, permitindo sua candidatura e posterior vitória nas eleições de 2022.
Entre as provas reunidas estão minutas de decretos que visavam instaurar um Estado de Defesa, conferindo ao então presidente Bolsonaro poderes excepcionais para reverter o resultado eleitoral. Uma dessas minutas, encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres, previa a criação de uma “Comissão de Regularidade Eleitoral”, que teria poder para invalidar votos e reverter a vitória de Lula.
As reuniões para pressionar militares a aderirem ao golpe ocorreram até os últimos dias do governo Bolsonaro. Em uma dessas ocasiões, o general Paulo Sérgio Nogueira, então comandante do Exército, recebeu a versão final do decreto golpista diretamente das mãos de Bolsonaro. O objetivo era garantir apoio armado para impedir a posse do presidente eleito.
Repercussões políticas e julgamento histórico
O avanço das investigações tem provocado forte impacto no cenário político nacional. Com Bolsonaro inelegível e enfrentando denúncias graves, aliados da extrema direita disputam espaço para assumir seu legado político. Enquanto isso, setores da direita tradicional tentam se distanciar do ex-presidente e traçar um caminho independente para 2026.
No Supremo Tribunal Federal, o ministro Alexandre de Moraes determinou um prazo de 15 dias para que os acusados apresentem suas defesas. O julgamento do caso será transmitido pela TV Justiça, permitindo que a sociedade acompanhe em detalhes um dos momentos mais críticos da democracia brasileira.
As revelações sobre a trama golpista colocam o país diante de um divisor de águas. O desfecho desse processo será determinante para a consolidação das instituições democráticas e para evitar que novas tentativas de ruptura voltem a ameaçar o Brasil.