A coluna recebeu uma manifestação da leitora Palowa Mendes, que a assina, e que reproduzimos abaixo:
As mães e as ditaduras
Ontem recebi pelo WhatsApp o vídeo de Débora, condenada por associação criminosa. Quem me enviou argumentou que se tratava de uma campanha “de mãe para mãe” e mencionou que “cortava o coração” saber que os filhos estão separados de sua mãe. Num ímpeto, respondi elencando todos os crimes que a condenada cometeu e deixei claro que não concordava com o argumento.
Então comecei a pensar sobre as mães em regimes ditatoriais:
- Eunice Paiva, sentada numa sorveteria com os filhos no dia em que soube do assassinato do marido, torturado até a morte num quartel militar.
- Olga Benário entregue aos Nazista pela Ditadura do Estado Novo grávida pra ser morta nas Câmaras de gás;
- Zuzu Angel, que teve seu filho torturado e morto e foi assassinada por buscar justiça por ele e lutar contra a ditadura.
- Eunice Silva do Rêgo – esposa de Adolfo Lira do Rêgo que teve seu filho inocente, preso e condenado no final de 1965 em Recife;
- Dona Elizabeth Teixeira, camponesa presa e torturada pela Ditadura Militar, que, ao ser solta, precisou entrar na clandestinidade para proteger sua vida e a dos filhos, deixando-os por décadas.
- As mães pretas e pobres das vilas, favelas, palafitas e comunidades periféricas, que tiveram seus filhos assassinados pela polícia e pelas milícias — os “esquadrões da morte” — sob a acusação criminosa e institucionalizada de “vadiagem”.
- As mães de estudantes, jornalistas, artistas e trabalhadores… que lutavam por liberdade e democracia e viram seus filhos desaparecerem para sempre.
- As Mães e Avós da Praça de Maio, que tiveram filhos e netos sequestrados e mortos pela ditadura.
- As mães que foram presas, violentadas grávidas, torturadas, e que assistiram suas crianças serem torturadas até a morte pela crueldade dos “homens de bem” do regime militar, dentre tantas.
Já a criminosa que se diz “mulher e mãe de bem” abandonou os filhos, foi para Brasília, instalou-se dias no acampamento em frente ao quartel do Exército e associou-se àqueles que tramavam um golpe militar. Onde acontecia a organização de ataques terroristas: o caminhão-bomba para explodir o aeroporto de Brasília, a derrubada de torres de energia para provocar um apagão no país, a queima de ônibus, a invasão da sede da PF, o bloqueio de estradas, a distribuição de armas e, por fim, o 8 de janeiro, quando destruíram símbolos do Estado Democrático de Direito. A pichação na Estátua da Justiça foi, para ela, apenas a cereja do bolo. A “Cabeleireira” é parte de uma facção criminosa que atentou violentamente contra a democracia brasileira.
Em sua saga pela intervenção militar, ela não lembrou dos filhos — enquanto eu e milhões de mães neste país pensávamos nos nossos, e em quão perto estávamos de perder nossa liberdade, sermos assassinadas, estupradas, ou ver nossas filhas violentadas em um porão; de assistir nossos filhos serem perseguidos e mortos se o golpe que ela apoiou, liderado por Bolsonaro, seus generais e coronéis, triunfasse.
Débora e todas aquelas mulheres das portas de quartéis, dos bloqueios nas estradas, do 8 de janeiro, que defendem o golpe militar, são criminosas. Atentam contra a liberdade, contra a democracia, contra a vida — porque Ditadura Mata.
Como mãe, espero que campanhas como essa sejam feitas para libertar mulheres que roubaram pão ou macarrão para alimentar seus filhos e foram presas, condenadas e tiveram a guarda das crianças revogada.
Sem anistia para golpistas.
Palowa Mendes